top of page

A Veterana segue pedindo passagem

  • Foto do escritor: Matheus Fernandes
    Matheus Fernandes
  • 19 de jan. de 2019
  • 3 min de leitura


Estádio 'Lanchão', casa da Veterana, durante jogo contra Botafogo de Ribeirão - Reprodução: Jornal Diário Verdade


No país do futebol, onde multidões fazem o possível e o impossível para acompanhar o clube do coração, não é nada surpreendente imaginar que cada região e localidade se relacione com o esporte por algum motivo. Seja pelo êxtase e inspiração, seja pelo enorme envolvimento da população com as atividades desportivas — é de se compreender, afinal, basta refletir acerca de quais eram as possibilidades de lazer que classe trabalhadora tinha na década de 10. No caso de Franca, esse motivo é, desde 1912, a paixão pela Francana, ou melhor dizendo, pelo pulsar do sangue esmeraldino.


Fundada por professores e profissionais liberais — David C. Ewbank, Beneglides Saraiva, Homero Pacheco Alves e Sabino Loureiro — nas primeiras décadas do século XX, a Associação Atlética Francana fez e ainda faz história. O clube acanhado, daquele longínquo município do interior do Estado de São Paulo, conhecido por alguns como Feiticeira ou Veterana, foi pouco a pouco conquistando seu espaço no mundo desportivo — chegou até a alcançar o título de ‘campeã do interior’ depois de sucessivas vitórias contra os times da região em meados da década de 20.


O interessante é perceber que ainda que estejamos tratando de um clube, houve muito envolvimento por parte de toda a comunidade Francana. Um ótimo exemplo é seu hino, escrito por Emílio Marques — um antigo torcedor da Feiticeira e filho de um burocrata dos Correios. Nas palavras do próprio Alfredo Palermo, em 11 de outubro de 1981 para a Comércio da Franca, “Conheço muitos hinos esportivos mas não sei se haverá algum mais vibrante e mais belo”.


Todo esse engajamento da comunidade em prol do desenvolvimento e afirmação da Veterana, inseriram o clube não só no imaginário coletivo, mas também no cotidiano do Francano. Nas vitórias e nada derrota estavam lá, para aplaudir o time ou xingar e partir para cima do juiz. Fato interessante é que todos esses ‘exageros’ perpetrados contra os juízes, lhes renderam o ótimo apelido, por parte dos torcedores da Francana, claro, de ‘juízes de Uberaba’ — fazendo clara alusão aos momentos em que os esmeraldinos foram prejudicados pelo excesso de ‘patriotismo’ ou, jargão conhecido hoje em dia, de ‘clubismo’ dos uberabenses.


As façanhas alcançadas pela Francana foram além do esperado. O clube se envolveu em disputas com outros clubes de Ribeirão Preto, Batatais, Brodowski, Uberaba e, posteriormente, Campinas, Rio Claro, Piracicaba, Guarulhos e por aí vai... Mas, os feitos não pararam, em 1923 é campeã do Torneio da Mogiana contra o Botafogo de Ribeirão Preto. Faria o mesmo dois anos depois, em 1925, só que desta vez sem perder um jogo sequer. Vinte anos mais tarde, montaria seu primeiro time de futebol profissional e contaram com a chegada de dois jogadores muito importantes — Botelho do Jabaguara e Brandãozinho da Seleção.


Apenas quatro anos depois de ingressar no futebol profissional, o Francana enfrenta o Atlético Mineiro, o Corinthians e o São Paulo e termina em terceiro lugar no campeonato estadual de São Paulo. E, manteria esse desempenho sem muitas alterações na sua dinâmica externa e interna até meados de 1969, quando data a inauguração do ‘Lanchão’ — estádio construído pela Prefeitura, à época gerida por José Lancha Filho. Oito anos mais tarde, em 1976, a Francana assume também o time de Basquete e, durante o tempo que o administrou, mostrou grande desempenho — foram 47 títulos com 320 vitórias e apenas 120 derrotas. Dentre os títulos, vale lembrar dos Paulistas, Brasileiros, Sul-americanos e até do vice-mundial de 1980 em Sarajevo na Iugoslávia.


Já no início dos anos 2000, o clube passa por algumas dificuldades e assume publicamente estar endividado. No entanto, não seria situação ruim o suficiente para que a Veterana não emplacasse algumas conquistas, ainda que fossem apenas políticas — em 2009 a Francana inscreve seu time feminino no Campeonato Paulista e posteriormente passa a disputar a Copa do Brasil — ou culturais — em 2012, embora tenha sido desclassificada no Paulista da Série A3, fora do campo o time foi homenageado pelo samba enredo “Filhos de Gandhi”.


Não se sabe ao certo quais serão os próximos passos da Associação Atlética Francana, mas pode-se dizer com toda certeza que eles irão ser dados. No campo ou fora dele, a Veterana é amor incondicional dos Francanos e seguirá apenas aprofundando seus símbolos na memória de todos que aqui nasceram, viveram ou vivem. O futebol moderno pode dificultar o acesso aos estádios e até transformar a paixão e emoção em um espetáculo frio de 90 minutos, mas nunca conseguirá suplantar a verdadeira paixão esmeraldina que corre nas veias de todos que já ouviram: “É dia de jogo, para o coração. Visto minha verdinha e vou pro Lanchão!”




Matheus Fernandes é Historiador, Representante de Franca no Sistema Estadual de Museus de São Paulo e Colunista do Jornal Diário Verdade

Comments


© 2023 por Matheus Fernandes

  • Facebook B&W
  • Instagram B&W
bottom of page