E assim surgiu o Distrito Industrial
- Matheus Fernandes
- 22 de abr. de 2019
- 4 min de leitura

O intenso processo industrial vivido pela cidade de Franca nos anos 60, ao mesmo tempo que inseria o município em outro patamar, também ocasionava alguns dilemas. No mesmo caminho, o flerte do setor calçadista com a possibilidade de transformar Franca em uma cidade exportadora, mergulhou o município em uma cruzada que ascendeu a discussão sobre o Distrito Industrial.
Isto é, o debate que surgiu final dos anos 60, trouxe uma temática um tanto cara para a cidade. As indústrias estavam se consolidando no mercado — seja ele interno ou externo — e, em função disso, necessitavam de um espaço em condições de permitir o crescimento de forma mais ordenada — afinal, muitos são os relatos de empresas familiares que operavam dentro da cidade e, muitas vezes, dentro da própria casa. A expansão do parque fabril, portanto, está envolta num misto de interesses e preocupações: melhor arranjar a produção calçadista e, ao mesmo tempo, permitir que Franca se transformasse em um polo exportador.
Pouco tempo depois, a questão calçadista encontrou outra figura que também viria a jogar água no moinho do Distrito Industrial. Já em fins dos anos 70, os curtumes — atividade comum na cidade desde o século XIX — transformaram-se em verdadeiros problemas. Parte significativa dos curtumes da cidade, que se instalaram — na maior parte das vezes — às margens do córrego Cubatão, acabaram sendo envoltos na malha urbana de Franca. O problema, é que seus resíduos são altamente poluentes e foram, durante muito tempo, disparados de
forma indiscriminada nos córregos e afluentes.
É nesse contexto, portanto, que se inicia a discussão por medidas efetivas no combate à degradação do ecossistema e, sobretudo, no melhor arranjo possível para a estruturação do parque fabril francano. Pois, de um lado havia interesse direto em reposicionar as indústrias e os industriais, do outro, um interesse maior ainda em retirar os curtumes de dentro da cidade.
Como mostra Mauro Ferreira, os estudos em busca de uma área para a implantação do Distrito Industrial tinham como horizonte sanar essas questões e proporcionar à Franca uma nova disposição urbana capaz de acomodar as demandas da cidade — tanto do ponto de vista econômico e social, quanto das preocupações ambientais.
A área escolhida levava em consideração alguns fatores: a proximidade das rodovias e da área central da cidade — que dista apenas 3 km do Distrito; o afastamento das aglomerações residenciais; a facilidade na captação de recursos hídricos pela existência de mananciais próximos; a acessibilidade do ponto de vista da ocupação — visto que a área era preenchida por pastagens; e por fim, a proximidade das linhas de energia elétrica somadas à situação favorável dos ventos dominantes — trata-se de um local em que as correntes predominantes apontam para o sentido contrário da cidade.
No entanto, esse debate envolveu não apenas os empresários, mas também o poder público e toda sociedade civil, em especial a burguesia — que já estava pelas tabelas com a 'fedentina' na Vila Industrial. Foi no bojo da aprovação do Plano Diretor em fins de 1971, na Câmara Municipal, que ficou estabelecida a necessidade da implantação do Distrito Industrial — é preciso dizer que os aspectos que versavam sobre a imediata implantação do D.I não foram aceitos, condicionando sua inserção ao prazo de 2 anos posteriores.
Em meio a discussões pra lá de acaloradas na Câmara — fortes críticas foram tecidas à gestão de Hélio Palermo por sua negligência quanto a continuidade do projeto — o debate fora reacendido diversas vezes. Algumas delas pelo interesse direto — dos curtumeiros, haja vista as sanções que estavam sofrendo por conta dos disparos de poluentes — outras pelo interesse comum.
Ainda que em 1972 — por meio da lei 2.100 de 21 de setembro — o município tenha autorizado a desapropriação de uma gleba de terras para uso do Distrito Industrial, a efetiva construção de infraestrutura para a área destinada ao parque fabril de Franca só veio a ser concretizada nos anos finais da década de 70 e começo da década de 80 — sob a gestão de Maurício Sandoval. A avenida Santos Dumont, por exemplo, só teria sido pavimentada, como mostra Mauro, em 1982.
A consolidação do Distrito veio sob a gestão de Sidnei Rocha — aproveitando-se de todos os estudos e benfeitorias das gestões anteriores no local —, com a aprovação e implantação da empresa de economia mista responsável pela administração do bairro — Distrito Industrial de Franca S.A (DINFRA). Mas, que fique claro, não podemos atribuir o mérito a esse ou aquele prefeito exclusivamente. De 1967 a 1984, diversos quadro políticos da prefeitura interviram e participaram de alguma forma para que o Distrito fosse concretizado, o que nos mostra que há pelo menos 50 anos nossa cidade trabalha e cresce junto ao setor calçadista.
Hoje, pode-se dizer que o Distrito Industrial vive aflições parecidas com àquelas de meados dos anos 80 — a busca por novas indústrias e investidores. Afinal, neste mundo em que o capital corre, cada vez mais, para baratear a produção, o sonho de Franca manter-se como pólo fabril está cada vez mais distante. Ou tomamos uma providência, ou apenas restará a história de que este lugar, um dia, foi conhecido como a Cidade do Calçado.
Matheus Fernandes é Historiador, Representante de Franca no Sistema Estadual de Museus de São Paulo e Colunista do Jornal Diário Verdade
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