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O que Saturnino de Brito tem a nos ensinar?

  • Foto do escritor: Matheus Fernandes
    Matheus Fernandes
  • 30 de jul. de 2019
  • 3 min de leitura


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Croqui dos canais de Santos, projetado pelo engenheiro sanitarista Francisco Saturnino de Brito em 1910. Disponível em: Acervo online da Biblioteca Nacional.

O protagonista dessa semana é Francisco Saturnino de Brito. Um engenheiro sanitarista que, embora não tenha diretamente nenhuma filiação com o município, tem muito a nos dizer. Em idos da década de vinte, isto é, quase cem anos atrás, Saturnino já fazia uma defesa enfática da responsabilidade ambiental.


Consagrou-se como o pai da engenharia sanitária e desenvolveu, ao longo de sua carreira, inúmeros projetos de saneamento — os canais de Santos, o projeto de Pelotas e Rio Grande, os canais do Recife e de Natal, bem como o 'controle de enchentes'. Foi, enquanto presidente da Comissão de Melhoramentos do Tietê, o idealizador da retificação do rio. Mas, com uma plataforma de retificação era bem diferente do que fora implementado. Saturnino respeitava as áreas alagáveis das margens do Tietê e sustentava o impedimento da ocupação urbana do perímetro inundável.


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Francisco Saturnino de Brito em 1921, aos 57 anos de idade.

Para além de tudo isso, sua marca foi a defesa extenuante da exploração do potencial hídrico brasileiro. Acreditava nos rios como alternativa viável ao crescimento econômico, vide as possibilidade de transporte de pessoas e mercadorias. Chegou a propor, inclusive, a criação da Confluência de Rios do Ibirapuera como mecanismo para iniciar o proveito de nossos cursos d'água. Mas, foi como sanitarista que Saturnino alcançou seu lugar ao sol. À época, doenças como varíola e febre amarela — que se propagaram graças às péssimas condições de saneamento básico —, eram verdadeiras máquinas de mortandade.

Foi ele quem deu resposta aos problemas de municípios como Santos, Pelotas, Recife e Natal.


Com o crescimento célere das cidades brasileiras, a opção foi pela modal de transporte individual, não pelo rios. Foi Prestes Maia quem se tornou Prefeito de São Paulo e, posteriormente, governador, não Saturnino. Se Saturnino tivesse sido vitorioso, talvez estivéssemos navegando e nos utilizando do Tietê e do Sapucaí, para escoar nossas mercadorias e melhorar nosso deslocamento regional.


A visão de mundo e, portanto, que direcionava o crescimento foi centrada nos automóveis. Com eles, para se deslocar e deslocar a produção, e por eles, diante do papel relevante da estruturação da indústria automobilística no Brasil. A opção nada tímida de Maia, utilizou-se do pretexto do 'progresso' para exportar sua formatação urbana ao resto do Estado. Nas palavras do professor Alexandre Delijaicov, para instituir um urbanismo rodoviário.


O caminho adotado, diante a topografia brasileira, tinha como regra a drenagem urbana — responsável por controlar o escoamento e os cursos d'água através de tubos, valas e fossos. Embora muitos fossem os elogios à Prestes, Saturnino tinha razão ao se opor à ocupação das áreas alagáveis. Mais do que isso, a hipótese do sanitarista só tem se confirmado com a expansão demográfica. Ou melhor, com a combinação de três fatores: o aumento da população urbana e, por consequência, a impermeabilização; a desregulamentação da ocupação em margens de rios e córregos; e por fim, a enorme e desenfreada intervenção humana nos cursos d'água.


É certo dizer que poupamos vidas através da ampliação de acesso ao saneamento básico. Também é certo dizer, que em nome do progresso, nós criamos esse negócio chamado 'enchente'. A dupla Bagres e Cubatão tem nos dado sinais há muito tempo — 2006, 2009, 2011, 2015, 2017 e 2019 —, só não vê quem não quer.


Matheus Fernandes é Historiador, Representante de Franca no Sistema Estadual de Museus de São Paulo e Colunista do Jornal Diário Verdade

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